Normalmente a Administração pratica actos administrativos, muitas vezes, porém, e a tendência actual vai no sentido do incremente deste modo de agir, a Administração Pública actua de forma diferente, desta feita em colaboração com os particulares, usando a via do contrato, que é uma via bilateral, para prosseguir os fins de interesse público que a lei põe a seu cargo. Isto significa que, nestes casos, a Administração Pública necessita de chegar a acordo com aqueles para constituir modificar ou extinguir relações jurídicas administrativas.
É o que se passa, por
exemplo, quando a Administração precisa de executar obras públicas e por isso
se socorre de empreiteiros de obras públicas, que são empresas privadas: aqui
não faz sentido que a Administração vá impor unilateralmente a um empreiteiro que
lhe faça uma determinada obra; ela tem de acordar com ele os termos e as
condições em que a obra vai ser executada.
No entanto, o contrato
administrativo não é sinónimo de qualquer contrato celebrado pela Administração
Pública com outrem: só é contrato administrativo o contrato com um regime
jurídico traçado pelo Direito Administrativo. O elemento essencial do regime
jurídico destes contratos administrativos é a possibilidade de o conteúdo das
suas prestações ser alterado, durante a execução do contrato, para satisfação
das novas exigências do interesse público – no entanto, o princípio do
equilíbrio financeiro do contrato deve ser sempre respeitado, de tal forma que
o interesse público não seja satisfeito à custa dos legítimos interesses dos
particulares, nem estes possam sobrepor-se à necessária garantia do primeiro.
Sendo ambos acordos de
vontades, o contrato administrativo e o contrato de direito privado
distinguem-se pela diferente natureza jurídica dos seus efeitos, ou, noutra
perspectiva, pela especial intensidade que o factor interesse público
desempenha no primeiro. Como diz o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, o que
autonomiza os contratos administrativos é o facto de o interesse público
prosseguido pela Administração não só encontrar-se presente como também
prevalecer sobre os interesses privados em presença, o que explica o
afastamento do regime de Direito privado.
Alguns autores alemães
(Otto Mayer, Jellinek) entendiam que a figura do contrato era incompatível com
o espírito e a essência do direito público: só no direito privado é que seria
possível encontrar e construir a figura do contrato. Os seus argumentos são que
o Estado é soberano e, portanto, não se pode vincular por contrato a um
particular.
A isto responderam os
partidários da admissibilidade da figura do contrato propriamente dito: nem
toda a Administração Pública é Estado e o Estado, quando actua no âmbito do
Direito Administrativo, não é o Estado-soberano, mas sim o
Estado-administração; para além disso, o Estado, no contrato administrativo,
não se demite da sua autoridade, a Administração não se despoja dos poderes de
autoridade que tenha de conservar, o contrato administrativo não é um contrato
baseado na estrita igualdade jurídica entre as partes.
1. Espécies
Existem, no artigo
178º/2 do CPA, oito espécies de contratos administrativos:
a. Empreitada de obras
públicas
b. Concessão de obras
públicas
c. Concessão de serviços
públicos
d. Concessão de exploração
do domínio público
e. Concessão de uso
privativo do domínio público
f. Concessão de exploração
de jogos de fortuna ou azar
g. Fornecimento contínuo
h. Prestação de serviços
para fins de imediata utilidade pública
Existem, ainda, outras
espécies de contratos administrativos, no entanto não tipificados tais como os
contratos de cessão a título precário de bens do domínio privado do Estado;
contratos de desenvolvimento para habitação, contratos de urbanização, entre
outros.
2. Regime Jurídico
O regime jurídico dos
contratos administrativos é constituído quer por normas que conferem
prerrogativas especiais de autoridade à Administração, quer por normas que
impõem à Administração especiais deveres ou sujeições. Este regime é traçado
principalmente pelo Direito Administrativo – pelo CPA e pelos princípios gerais
do Direito Administrativo – mas também por algumas normas de Direito Financeiro
e Direito Comunitário.
Os princípios gerais
aplicáveis aos procedimentos conducentes à celebração de contratos
administrativos são os seguintes:
a. Princípio da legalidade
Este princípio exige, desde logo, que o fundamento normativo de qualquer
procedimento adjudicatório deve basear-se num acto legislativo. A entidade
adjudicante (adjudicação é o acto administrativo pelo qual o órgão competente
escolhe a proposta preferida, seleccionando o particular com quem a
Administração decide contratar), para iniciar, carece, pois, de uma norma
habilitante proveniente do poder legislativo. Tal norma deverá formular um
quadro ou descrição fundamental suficiente para demarcar o âmbito da actuação
autoritária do órgão administrativo sobre as esferas jurídicas dos particulares
e para repartir o âmbito de actuação entre os diversos órgãos das pessoas
colectivas que integram a Administração.
No que toca especificamente aos procedimentos concursais, não é seguramente
admissível a abertura de um concurso sem a publicação prévia das normas que o
disciplinam. A lei pode conferir ao promotor do concurso maior ou menor
autonomia na condução dos trâmites do procedimento do concurso e na própria
escolha do co-contratante, mas há uma condição que, em qualquer caso, tem de se
observar: essa autonomia há-de ter a lei por sua base e medida. Ou seja, mesmo
nos domínios não cobertos pelo princípio da reserva de lei, a Administração num
concurso não deixa de estar adstrita à obrigação de fixar e divulgar as regras
do “jogo”.
b. Princípio da
proporcionalidade
Este princípio impõe que os procedimentos que precedem à celebração de contratos
administrativos, devem garantir um equilíbrio nas relações entre cidadãos e
ainda entre eles e a própria Administração, proibindo contrastes intoleráveis
entre vantagens reconhecidas a um ou alguns sujeitos de direito e sacrifícios
que impendem sobre os demais.
Por outro lado, deste princípio decorre que, dentro dos limites da lei,
deve ser escolhido o procedimento mais adequado ao interesse público a
prosseguir, ponderando-se os custos e os benefícios decorrentes da respectiva
utilização e, por outro lado, que no procedimento apenas se devem efectuar as
diligências e praticar os actos que se revelem indispensáveis à prossecução dos
fins que legitimamente se visem alcançar.
c. Princípio da igualdade
Além de assegurar a inexistência de desequilíbrios entre situações
jurídicas contratuais, ele está subjacente à opção preferencial do legislador
pelo procedimento concursal na formação dos contratos administrativos (artigos
182º e 183º CPA). O procedimento preferido pelo legislador visa, justamente, assegurar
a publicidade, a transparência e a não discriminação entre os interessados no
procedimento e decisão do concurso. Viola, portanto, o princípio da igualdade,
a reformulação, para efeitos de decisão das propostas concorrentes, ainda que a
pretexto de facilitar ou tornar possível a comparação.
d. Princípio da
imparcialidade
Veda quer o favorecimento ou desfavorecimento injustificado de qualquer
virtual co-contratante, quer qualquer desigualdade devida a desígnio de
identificação da posição da Administração com um dos sujeitos jurídico-privados
envolvidos. Impõe, ainda, o dever por parte da Administração de ponderar todos
os interesses públicos e privados equacionáveis para o efeito de decisão antes
da sua adopção. Ou seja, na formação de um contrato administrativo deve a
Administração proceder à exaustiva ponderação de interesses envolvidos, o que
supõe o conhecimento cabal dos dados de facto a eles respeitantes.
e. Princípio da boa-fé
Assume especial importância nos procedimentos concursais. Estes têm
justamente a especificidade de criarem uma relação de confiança juridicamente
tutelada entre a entidade adjudicante e os potenciais co-contratantes. A
protecção da confiança, vertente fundamental do princípio da boa-fé, conhece
particular expressão na manutenção do quadro jurídico delimitado no acto de
abertura do concurso – garantia de transparência, igualdade, estabilidade,
clareza e precisão.
f. Princípio da
concorrência
Visa assegurar que os entes públicos, na satisfação de interesses
administrativos que lhes estão cometidos o façam da forma publicamente mais
vantajosa possível. Assim, é, por um lado, imprescindível assegurar que todos
os concorrentes respondam aos mesmos requisitos de modo a possibilitar uma
plena comparação e, por outro, existe a vinculação dos concorrentes a não
poderem retirar nem alterar nada das suas propostas a partir do momento em que
as entregaram (salvo em casos de concursos por negociação).
g. Princípio da publicidade
Dentro do respectivo âmbito de candidaturas, quaisquer deliberações da
entidade adjudicante ou das comissões do concurso que tenham relevo no
procedimento concursal devem ser dadas a conhecer a todos os que nele possam
vir a estar ou estejam já interessados.
h. Princípio da
transparência
Os artigos 267º e 268º da CRP, resume um modo de ser da Administração, um
objectivo ou um parâmetro para medir o desenvolvimento da actividade da
Administração. Postula, em síntese, que a Administração deve fundamentar os
seus actos, garantir cabal audiência dos particulares interessados e não lhes
pode sonegar informação quer sobre o andamento dos processos em que sejam
directamente interessados, quer sobre as resoluções definitivas que sobre ele forem
tomadas.
Pedro Saldanha
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