Presunção de culpa; Uma
perspectiva do artigo 10º da lei 67/2007
A responsabilidade civil
administrativa é, nas palavras do Professor Marcelo Rebelo de Sousa, o
“conjunto de circunstâncias da qual emerge, para a administração e para os seus
titulares de órgãos e trabalhadores, a obrigação de indemnizar dos prejuízos
causados a outrem no exercício da actividade administrativa”.
A designação de
“responsabilidade civil” assenta mais em imperativos históricos e dogmáticos do
que, arriscaria, propriamente em razões estritamente jurídicas. Como nota o
mesmo professor, “ o qualificativo civil não remete para o direito privado”,
mas apenas visa predominantemente aludir à necessidade da “reparação de danos”.
Isto dito, torna-se claro que, embora existam semelhanças (que começam na
própria terminologia), as responsabilidades do direito civil e do direito
administrativo não são necessariamente sinónimas. Os pressupostos são, como não
poderia deixar de ser, idênticos: Facto (acto) voluntário; Ilicitude; Culpa;
Dano; e Nexo de Causalidade. No entanto, e no cerne de alguns deles,
encontram-se diferenças importantes. É o caso, por exemplo do artigo 9º da lei
67/2007 que vem assimilar ao conceito de ilicitude todas as condutas ilegais.
No entanto, o presente post quererá versar sobre aquela que
será talvez a marca mais distintiva da responsabilidade civil da administração:
a presunção de culpa, plasmada no artigo 10º da já citada lei.
Proporia, antes de mais, aos
colegas um esforço de análise sistemática com os conteúdos já estudados em
Direito Civil, e isto para recuperarmos o conceito de que a responsabilidade
objectiva se funda na presunção legislativa de que existem posições de
vantagem, de uns agentes perante outros, que justificam o tratamento
aprioristicamente diferenciado em sede de responsabilidade. Por outras
palavras, no Direito Civil existe responsabilidade objectiva, i.e., situações
em que a culpa é dispensada enquanto pressuposto da responsabilidade, sempre
que a situação em causa seja classicamente típica de uma relação desigual.
Provavelmente com o mesmo
raciocínio em mente, mas não com a mesma
exacta solução preconizada, o legislador regulou a situação da culpa na
responsabilidade civil administrativa, plasmada no cito artigo 10º da lei que
define o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais
Entidades Públicas.
Efectivamente, no seio das
actuações administrativas, será correcto presumir uma diferença entre o
posicionamento do particular e o da administração (tal como a lei Civil o faz
em determinadas situações), no entanto, o modo como esta lei o faz, abre espaço
a que eventuais desequilíbrios que ela pretenda evitar se formem na mesma.
A culpa dos particulares, nos
termos do 10º, nº1, é medida por via da “diligência e aptidão que seja razoável
exigir “ a um “titular de órgão, funcionário ou agente, zeloso e cumpridor”,
num critério que se aproxima bastante da conhecida bitola civilista do “bom pai
de família”.
O cerne da questão surge,
contudo, nos números seguintes do enunciado artigo, e com as presunções de
culpa que consigo trazem.
A presunção do nº2 pode ser,
conforme expõe a Professora Alexandra Leitão, duplamente ilidida. Isto é, “para
mais” ou “para menos”, conforme se prove que a culpa em causa é grave, e não
somente leve, ou conforme se prove que ela de todo inexistiu.
Embora tal preceito e tal
presunção constituam uma aproximação da responsabilidade administrativa a uma
certa objectivação, o que é facto é que ela ainda contém “válvulas de escape”,
fruto de um certo cariz subjectivista que mantém, que permitem a
desresponsabilização da Administração. Isto, retomando o ponto introdutório,
não faz sentido, mesmo quando comparado com o princípio presidente à lógica
civilista, em função da disparidade de posições. Tal torna-se notório quando
verificado que será possível afastar a obrigação de indemnizar por falta de
culpa, quando seja possível ilidi-la, conforme exemplifica a Professora, em
situações de “ambiguidade no quadro legal aplicável; proliferação de legislação
extravagante; divergência jurisprudencial e doutrinária sobre a questão; ou
simples necessidade de cumprir comando normativo inconstitucional”. Isto dito,
repugnará certamente ao sentir geral que um acto da administração, que cumpra
com todos os demais quatro pressupostos da responsabilidade, possa ser
desresponsabilizado por ser afastada a dita presunção de culpa. A sujeição da
Administração ao princípio da legalidade tem uma “dimensão garantística” que
fundamenta a função reparadora do instituto da responsabilidade.
Explanado o problema, cumpre,
de acordo com a posição da Professora Alexandra Leitão que acompanhamos,
apresentar vias alternativas de solução.
Desde logo, poderia ser instituída uma responsabilidade, não ilidível, mas
inilidível (sem prejuízo de se manter a vertente da demonstração do “mais”,
isto é, de provar a existência de culpa grave ou dolo) ou, segunda solução, até
mesmo objectivar em absoluto tal pressuposto, prescindindo-se completamente da
culpa. Tal situação, ressalva a Professora, não afastaria o sempre possível
regresso do despendido, no plano interno. No entanto, quando se chegasse a esse
estádio de evolução, já o ressarcimento da posição subjectiva (danificada) do
particular estaria assegurado.
Tal solução seria aplicável
tanto no âmbito das relações da administração com órgãos jurisdicionais (nas
citadas situações de ambiguidade jurídica) como nas relações com os seus
titulares de órgãos ou agentes (nas situações não legislativas). No âmbito da primeira situação frise-se ainda
que admitir a possibilidade da ilição contra o órgão administrativo, restando
ao particular a reacção contra o órgão legislativo conduziria a uma redução
tremenda das suas pretensões indemnizatórias, fruto do bem mais restrito regime
do artigo 15º/2 da recorrentemente citada lei, que tem exigências bem mais
apertadas no que concerne à responsabilização por acto da função legislativa.
Em função de tudo o exposto,
crê-se que a actual configuração legislativa, embora tenha presumido
correctamente a culpa, aproximando-se de uma posição objectivista (que faz
sentido em função da disparidade de posições que a administração assume face ao
particular), deveria tê-lo feito com maior definitividade. Nesse prisma,
afigurar-se-ia razoável uma objectivação do preceito do artigo 10º no sentido
de se dispensar, em situações de actuação administrativa, o requisito da culpa.
Efectivamente, e porque à Administração (latu senso) compete também o poder
jurisdicional, não faz sentido, verificada a actuação ilícita, que tem
aceitavelmente inerente a produção do dano, dispensar-se a imputação por força
da desculpabilidade da actuação. Tal torna-se mesmo chocante nas situações em
que tal exclusão da culpa provém de uma actuação na qual a dita administração teria
a responsabilidade de prover ao seu agente o ambiente jurídico sereno para que
este pudesse tomar a decisão acertada. Posto isto, e particularmente em
situações como a que acaba de ser descrita, repugna que o particular possa vir
a “pagar duas vezes” por erros sucessivos da administração, sendo lesado e
vendo a sua pretensão indemnizatória negada em função da maior restrição de requisitos
para responsabilização a administração jurisdicional. Defende-se, por isso, e
em suma, uma objectivação total do requisito da culpa, que faz tanto sentido
para qualquer relação da administração com o particular, quanto o faz na lógica
civilista nas situações em que existe.
Tiago Quaresma, nº22115
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