O dever de
fundamentação
É após o 25 de Abril de 1974 que
o Direito Administrativo perfilhou a orientação de tornar obrigatória a
fundamentação para a maioria dos actos administrativos. Surgiu, sobretudo, com
um propósito de reforço das garantias dos particulares.
Actualmente, o dever de
fundamentação dos actos administrativos está consagrado nos artigos 124º a 126º
do CPA. Além disso, a CRP pronuncia-se sobre a matéria no artigo 268/3, contudo
é a lei ordinária que é mais exigente e extensa.
Para Freitas do Amaral a
fundamentação de um acto administrativo consiste na enunciação explicativa das
razões que levaram o seu autor a pratica esse acto ou a dotá-lo de certo
conteúdo. O dever de fundamentação viu, aliás, aumentar o seu âmbito de
aplicação com a consagração como princípio geral de direito da audiência prévia
dos interessados antes da decisão final (artigo 100º e seguintes do CPA).
No artigo 124º CPA, vem regular
os casos em que existe dever de fundamentação. O elenco dos actos referidos no
presente artigo, são sobretudo lesivos de interesses a terceiros. Segundo
Vieira de Andrade, este elenco não constitui um conjunto ordenado, nem uma
perspectiva estrutural, nem de um ponto de vista funcional ou teleológico.
Revela-se uma compilação ditada por preocupações avulsas, resultantes da
experiência anterior e, de um modo relativamente arbitrária. Esta enumeração
legal mostra-se semelhante às adoptadas noutros países, quanto aos tipos de
actos que são submetidos a fundamentação obrigatória, nomeadamente na
generalidade dos sistemas europeus.
A fundamentação dos actos
administrativos é uma formalidade de grande importância, não só para o
particular lesado, mas também na perspectiva do tribunal competente poder
ajuizar o acto, sempre de acordo com o interesse público. Rui Machete aponta
algumas funções ao dever de fundamentar os actos administrativos. Em primeiro
lugar a defesa do particular, seguida do controlo da administração que deve
ponderar todos os factores para uma decisão mais correcta. Em terceiro lugar
deve existir uma pacificação das relações entre a administração e os
particulares, por último deve haver uma classificação e prova dos factos sobre
a decisão.
O número 2 do artigo 124º do CPA
refere a dispensa de fundamentação aos actos de homologação de deliberações
tomadas por júris e as ordens dadas pelos superiores hierárquicos aos seus
subalternos em matéria de serviço e com forma legal. No primeiro caso a
justificação da dispensa de fundamentação reside na sua natureza específica do
acto de homologação. No segundo caso a fundamentação, a existir, não seria
dirigida a terceiros, mas apenas ao subalterno.
Os requisitos de fundamentação
resultam do disposto no artigo 125º do CPA. Sendo que este tem de ser expressa,
tem de consistir na exposição, ainda que sucinta, dos fundamentos de facto e de
direito de decisão. Há que referir também o quadro jurídico que habilita a
administração a decidir, ou a decidir de certo modo. Ou seja, trata-se do
princípio da legalidade, como fundamento da acão administrativa. Por fim o
dever de fundamentação tem de ser claro, coerente e completo. Vieira de Andrade
refere que falta fundamentação ao autor que formula fundamentos baseados na
obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclarecendo as razões da decisão
tomada. Este autor fala ainda noutro requisito que é o da congruência, sendo
que o acto administrativo deve basear-se num processo lógico, coerente e
sensato, falando assim de um discurso sensato. No fundo a congruência refere-se
à relação entre a fundamentação e o conteúdo do acto.
Em jeito de conclusão, falta
assim referir as consequências da falta de fundamentação. Caso falte a
fundamentação num acto que deva ser fundamentado, ou se a fundamentação
existir, mas não corresponder aos requisitos exigido pela lei, o acto
administrativo, segundo Freitas do Amaral, será ilegal por vício de forma e
como tal, será anulável (artigo 135º CPA). Vieira de Andrade entende que
estamos perante uma insuficiência formal, não estando em causa eventuais vícios
ou desvios revelados ou contidos na declaração. O autor suscita ainda algumas
dúvidas relativamente ao tipo de invalidade que provoca. Para o professor de
Coimbra a falta ou a insuficiência de fundamentação deve ser tratada no
conjunto exclusivo dos vícios de forma em sentido estrito, uma vez que este
tipo de procedimento tem características próprias. Admite, assim, a nulidade
para casos onde a lesão provocada pelo vício se centra numa gravidade especial.
A aplicação da nulidade do acto não fundamentado constitui o instrumento
adequado para evitar a lesão do direito fundamental na sua dimensão de
garantia.
Duarte Alves, nº 21019
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