quarta-feira, 8 de maio de 2013

O Exercício do Poder Administrativo: o Regulamento Administrativo



Noção de Regulamento Administrativo:
 Os regulamentos administrativos traduzem-se em normas jurídicas emanadas no exercício do poder administrativo por um órgão da Administração ou outra entidade pública/privada para tal habilitada por lei. Constituem o nível inferior do ordenamento jurídico administrativo, sendo uma fonte secundária. Constituem também um produto da actividade da Administração indispensável ao funcionamento do Estado moderno, permitindo assim ao Parlamento desonerar-se de tarefas que considera incómodas ou para as quais não está tão qualificado, possibilitando desta forma uma adaptação rápida do tecido normativo a múltiplas situações específicas da vida que se encontram constantemente em mutação.
No entender doutrinário do Professor Diogo Freitas do Amaral, a noção de regulamento baseia-se em três elementos essenciais:
I.    Elemento de natureza material
Materialemnte, o regulamento administrativo consiste em normas jurídicas e sendo uma regra de conduta da vida social é dotada das características da generalidade (aplica-se a uma pluralidade de destinatários) e da abstracção (aplica-se a uma pluralidade de situações).
Enquanto comando abstracto não se esgota, normalmente, numa aplicação; ao contrário do acto administrativo, verificar-se-á sempre que em concreto se verificarem as situações típicas que nele se encontram previstas.
O regulamento administrativo não é um mero preceito administrativo, é também uma norma jurídica e, por isso, está sujeita a ser imposta mediante a ameaça de coacção e cuja violação pode levar a aplicação de sanções.



II.    Elemento de natureza orgânica 
Organicamente, este dita-se não só por pessoas colectivas públicas integrantes da Administração Pública, como também por pessoas colectivas públicas não integrantes da Administração (o Parlamento, por exemplo) quer por entidades de direito privado. 

III.    Elemento de natureza funcional 
Funcionalmente, importa salientar que o regulamento é emanado no exercício do poder administrativo.Tal aspecto torna-se relevante nos casos em que o órgão considerado não é exclusivamente órgão da Administração (como sucede com o Governo e as Assembleias legislativas regionais que são também órgãos políticos e legislativos), só se podendo tratar de regulamento administrativo nestes casos quando estas duas entidades tiverem actuado no desempenho das suas atribuições administrativas.  

Espécies de Regulamentos:
  As espécies de regulamentos podem ser apuradas à luz de quatro critérios fundamentais: 
a.    Relação entre o regulamento e a lei
Dentro desta espécie há que distinguir ainda duas subespécies: os regulamentos complementares ou de execução (aqueles que desenvolvem ou aprofundam a disciplina jurídica constante de uma lei) e os regulamentos independentes ou autónomos (regulamentos que os órgãos administrativos elaboram no exercício da sua competência, para assegurar a realização das suas atribuições específicas, sem cuidar de desenvolver ou completar nenhuma lei especial).
Dentro dos regulamentos complementares ou de execução, surgem-nos os regulamentos espontâneos (a lei nada diz quanto à necessidade da sua complementarização) e os devidos (é a própria lei que impõe à Administração a tarefa de desenvolver a previsão do comando legislativo).Tal distinção encontra-se constitucionalmente prevista no art. 112º/7 e 8 da CRP.
Os regulamentos complementares ou de execução caracterizam-se por serem regulamentos secundum legem, portanto, ilegais se colidirem com a disciplina fixada na lei.

Já quanto aos regulamentos independentes ou autónomos, estes não complementam qualquer lei anterior, sendo que a sua missão é a de estabelecer autonomamente a disciplina jurídica que há-de pautar a realização das atribuições específicas cometidas pelo legislador aos entes públicos considerados.
Assim, para que o poder regulamentar exista, a CRP ou a lei têm que o prever. Existem duas excepões, em que isso não acontece: 1º- no caso de regulamentos internos – onde se entende que os órgãos das diferentes pessoas colectivas públicas que compõem a Administração têm, por natureza, este poder, com fundamento no poder de direcção -; 2º- no caso dos regimentos de órgãos colegiais – onde é entendido que estes têm o poder de elaborar e aprovar os seus próprios regulamentos de organização e funcionamento, são os regimentos, com fundamento no poder de auto-organização dos órgãos colegiais.
 
      b.    Objecto
Quanto ao objecto, é fundamental falar-se nos regulamentos de organização, de funcionamento e os de polícia.
Regulamentos de Organização: procedem à distribuição das funções pelos vários departamentos e unidades de uma pessoa colectiva pública, bem como à repartição de tarefas pelos diversos agentes que aí trabalham.
Regulamentos de Funcionamento: disciplinam a vida quotidiana dos serviços públicos.
Regulamentos de Polícia: impõem limitações à liberdade individual com vista a evitar que, em consequência da conduta perigosa dos indivíduos, se produzam danos sociais.

 
c.    Âmbito da sua aplicação
Os regulamentos podem ser classificados ainda como: gerais (vigorando em todo o território continental), locais (tendo o seu domínio de aplicação limitado a uma dada circunscrição territorial) e institucionais (sendo emanados de institutos públicos ou associações públicas, para terem aplicação apenas às pessoas que se encontram sob a sua jurisdição).


d.    Projecção da sua eficácia
Podemos ainda dividir os regulamentos em: internos e externos.
Os primeiros, produzem os seus efeitos jurídicos unicamente no interior da esfera jurídica da pessoa colectiva de que emanam.
Os segundos, produzem efeitos jurídicos em relação a outros sujeitos de direito diferentes,ou seja, em relação a outras pessoas colectivas públicas ou em relação a particulares.
Esta classificação levanta, dois problemas fulcrais:
O primeiro, consiste em se perceber se os regulamentos institucionais que visam disciplinar o comportamento dos utentes de um serviço público são regulamentos internos ou externos. Existe quem entenda que são internos por não se dirigirem a todos os cidadãos em geral, mas apenas a alguns em especial. O Professor DFA não concorda com tal opinião. Para o Professor referido, são externos, pois não projectam a sua eficácia apenas na esfera jurídica de uma pessoa colectiva pública, produzem também sim efeitos em relação a pessoas que são sujeitos de direito distintos da pessoa colectiva em causa. Daí que estes regulamentos possam, por eles, ser impugnados contenciosamente, se forem ilegais ou inconstitucionais.
O segundo problema, prende-se em saber se são internos ou externos os regulamentos que a Administração elabora para disciplinar a actuação dos seus próprios funcionários. O Professor DFA entende que se impõe distinguir se se tratam de regulamentos aplicáveis aos funcionários na sua qualidade de funcionários, com o fim de disciplinar apenas a organização ou o funcionamento do serviço (serão, então, internos); ou se, contrariamente, se tratam de regulamentos aplicáveis aos funcionários na sua qualidade de cidadãos, sujeitos a uma relação jurídica de emprego com a Administração, com o fim de disciplinar essa relação e os direitos ou os deveres recíprocos que a integram (são, então, externos).
 
               Distinção entre regulamento e lei
   Um primeiro critério, de que partiu a escola clássica francesa, assenta na diferenciação entre princípios e pormenores, ou seja, que à lei caberia a formulação dos princípios e ao regulamento a disciplina dos pormenores. No entanto este é um critério vago.
Um segundo critério (sustentado por Marcello Caetano), reconhecendo haver algumas afinidades no plano material entre os dois, considera possível distingui-los porque ao regulamento falta a novidade, que é a característica da lei. Mas este critério cria o problema dos regulamentos independentes ou autónomos, pois estes não pressupõem na sua base nenhuma lei.
Um terceiro critério baseia-se na identidade material entre os dois, a distinção entre ambos só pode ser feita no plano formal e orgânico. Ela está na diferente posição hierárquica dos órgãos de onde emanam e, consequentemente, do diferente valor formal de um e de outro.

O Professor DFA, concorda com este último critério. A nossa CRP não fornece qualquer critério de definição de fronteira material entre o domínio legislativo e o regulamentar. Em cada área normativa deverá haver uma parte legislativa e uma regulamentar, mas a proporção em que isso acontece depende da lei; ela tanto pode esgotar a regulamentação da matéria, consumindo o regulamento (pois não há reserva de regulamento) como pode, igualmente, limitar-se a diferir para regulamento de certa entidade a tarefa de regulamentação material do assunto.

À luz do direito positivo vigente, entende-se como lei todo o acto que provenha de um órgão com competência legislativa e que assuma a forma de lei, ainda que o seu alcance seja estritamente individual ou contenha disposições de carácter regulamentar; entende-se como regulamento todo o acto dimanado de um órgão com competência regulamentar e que revista a forma de regulamento, ainda que seja independente ou autónomo e, por conseguinte, inovador.

Qual é a importância prática desta distinção?
Funciona como fundamento jurídico pois, a lei, em regra, baseia-se unicamente na CRP; o regulamento só será válido se uma lei de habilitação atribuir competência para a sua emissão. Uma lei contrária a outra lei, por exemplo, revoga-a. Enquanto que um regulamento contrário à lei é ilegal. Quanto à impugnação contenciosa, a lei só pode ser impugnada contenciosamente com fundamento em inconstitucionalidade, enquanto que o regulamento ilegal é, em regra, impugnável contenciosamente.


      Distinção entre regulamento e acto administrativo:
Tanto um como outro se caracterizam como comandos jurídicos unilaterais emitidos por um órgão competente no exercício de um poder público de autoridade. Mas, o regulamento, como norma jurídica, é uma regra geral e abstracta, ao passo que o acto administrativo, como acto jurídico, é uma decisão individual e concreta. Na maioria dos casos, a distinção entre estes termos é fácil. No entanto, há três casos excepcionais que levam a dificuldades:

1.    Comando relativo a um órgão singular
Por exemplo, ao Presidente da República. É norma (não é acto) se dispuser em função das características da categoria abstracta e não da pessoa concreta titular do cargo.


2.    Comando relativo a um grupo restrito de pessoas, todas determinadas ou determináveis:
Por exemplo, a disposição que promove ao posto imediato todos os actuais funcionários da Direcção Geral X. É norma (e não acto) desde que disponha por meio de categorias abstractas tais como promoção, actuais, funcionários, etc. Será acto, se contiver a lista nominativa dos indivíduos abrangidos, identificados.
 
   3.  Comando geral dirigido a uma pluralidade indeterminada de pessoas, mas para ter aplicação imediata numa única situação concreta:
Por exemplo, a ordem dada por certa Câmara Municipal aos habitantes de certa povoação para que hoje, por ter nevado, limpem a sua rua. Grande parte da doutrina considera haver aqui acto administrativo, mas o Professor DFA pensa que há norma pois existe a generalidade, o que não há é vigência sucessiva.


Ana Rapoula, Subturma 3, nº20968


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