As pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas
subjectivas violadas no âmbito da responsabilidade civil administrativa.
Noção e aspectos gerais
Caso a administração viole uma posição jurídica subjectiva de
um particular, a este não interessará apenas, e em regra nem sequer
principalmente, a reparação dos danos eventualmente provocados pela conduta
administrativa; a obter em sede de responsabilidade civil; com efeito o seu
interesse principal será de obter o restabelecimento da posição jurídica
violada. Este restabelecimento passará necessariamente pelo acatamento por
parte da administração, dos deveres a que estava adstrita perante o particular
e que antes não tinha observado; os deveres em causa podem ser deveres gerais
de respeito ou deveres creditícios, consoante a posição jurídica violada seja
absoluta ou relativa. A pretensão a este restabelecimento é também uma
pretensão reintegratória que assiste aos particulares em face da administração.
Fundamento das
pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.
As pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas
subjectivas violadas encontram o seu fundamento subjectivo na vinculação da
administração pública aos direitos fundamentais ( Art. º 1 CRP) e no
principio do respeito pelas posições jurídicas subjectivas dos particulares
(art. 266.º, 1 CRP) e fundamento objectivo no principio de legalidade. Da
combinação de ambos decorre a proibição de violação de posições jurídicas
subjectivas alheias e tendo ocorrido, ao
seu posterior restabelecimento.
Pretensões ao
restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas e responsabilidade
civil
A grande diferença entre estas pretensões reintegratórias dos
particulares perante a administração está nas suas funções: enquanto que a
primeira visa reintegrar as esferas jurídicas dos particulares pelos danos
sofridos em virtude da atuação administrativa, operando por isso para o futuro,
as segundas visam eliminar a ilegalidade cometida com a conduta administrativa,
agindo por isso sobretudo sobre o passado. Daqui decorre que enquanto a
responsabilidade civil é uma pretensão secundária, que visa a compensação de
direitos que foram violados, as pretensões ao restabelecimento de posições
jurídicas subjectivas violadas são pretensões primárias, pois visam a
realização daqueles direitos, possível por não se ter ainda consumado a sua
inutilização prática. Assim o restabelecimento de direitos e interesses
violados não consiste numa indemnização ainda que natural ou especifica, que é
sempre um sucedâneo do bem danificado, mas a restauração da própria posição
jurídica subjectiva violada.
Por exemplo se a administração ocupar materialmente de forma
ilegal um terreno de que é proprietário um particular, privando-o do rendimento
que aquele terreno lhe propicia, o proprietário adquire por um lado, uma
pretensão á restituição do imóvel (restabelecimento do direito de propriedade
privado) e por outro lado, uma pretensão ao ressarcimento dos lucros cessantes,
não auferidos em virtude da ilegítima privação do exercício do direito de
propriedade (responsabilidade civil da administração).
Ambas são cumuláveis entre si, designadamente quando a tutela
primária não apague todas as lesões decorrentes da conduta administrativa.
Tipos de Pretensões ao
restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.
Pretensões possessórias: A posse está definida no artigo 1251.º CC. Quando
haja justo receio de que ocorra uma perturbação da posse de um particular sobre
uma coisa por parte da administração, quando essa perturbação ocorra efetivamente ou quando haja esbulho ( privação ilegítima da posse) por parte
da administração os particulares adquirem uma pretensão reintegratória da posse
violada.
Pretensões reivindicatórias: A reivindicação é precisamente, a
pretensão que visa o reconhecimento judicial da propriedade ou de outro direito
real sobre uma coisa e a restituição desta, por quem a detenha ou possua ilegitimamente,
ao seu legítimo titular.
Pretensões inibitórias: As pretensões inibitórias visam impedir atividades da administração que, sem subtraírem a coisa a quem seja titular de um direito
real sobre ela, todavia o ameaçam ou perturbam. Exemplo: equipamento
administrativo emite ruido ou gases que se fazem sentir dentro de habitações.
Pretensões creditórias: Dos contratos administrativos e dos atos administrativos podem emergir para a administração deveres de efetuar prestações em beneficio dos particulares. Se a administração não cumprir os
interessados dos direitos creditícios violados tem o direito de exigir o
cumprimento dos contratos ou dos atos administrativos em causa.
Pretensões à reintegração de situações jurídicas lesadas por atos administrativos ou regulamentos imediatamente aplicáveis nulos ou inexistentes: A ocorrência de determinados atos ou omissões antes da certificação de nulidade ou inexistência de regulamentos e
atos administrativos (Exemplo: quando o trabalhador for demitido ou despedido
mediante um ato administrativo nulo deixando em consequência administração de
cumprir o dever, que lhe assistia, de pagamento de vencimentos) investe aos
particulares lesados numa pretensão ao restabelecimento fático da situação
jurídica que existiria se o ato nulo não tivesse sido praticado.
Pressupostos das
pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.
As pretensões em causa visam apenas reintegrar posições
jurídicas subjectivas violadas, pelo que é irrelevante para a sua existência a
ocorrência de qualquer dano ou a formulação de um juízo de censura quanto a
quem as violou. Quem seja, por exemplo, ilegitimamente privado do exercício do
seu direito de propriedade sobre uma coisa deve poder ser nele reintegrado
independentemente de sofrer danos com a sua privação ou de quem o lesou o fazer
culposamente. Assim, são apenas dois os pressupostos destas pretensões: a
existência de uma situação de afetação de uma posição jurídica subjectiva de
um particular pela administração e o carácter ilegítimo dessa afetação.
O conteúdo do restabelecimento
de posições jurídicas subjectivas violadas.
O restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas
pode implicar a prática de factos positivos ou negativos, materiais ou
imateriais, a entrega de coisas, ou o pagamento de quantia. São precisamente
estas as três finalidades dos processos de execução das sentenças dos tribunais
administrativos (arts. 162.º - 169.º, 170.º - 172.º CPTA) nos quais desembocará
em ultima análise a efetivação jurisdicional destas pretensões.
Modos de efetivação das
pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.
Estas podem ser satisfeitas pela administração,
espontaneamente ou a requerimento do interessado. Contudo, tipicamente, a sua efetivação faz-se perante os tribunais.
O art. 37.º,2,d) CPTA prevê que determinados processos sigam
genericamente a forma de ação administrativa comum. As pretensões inibitórias
e as pretensões ao cumprimento de contratos administrativos recaem ainda nas
previsões do art.37.º, 2, c), 1º parte, e e), 2º parte , CPTA. As pretensões ao
cumprimento de atos administrativos podem ser deduzidas em sede de processo
executivo ( 157.º, 3 CPTA).
A regra vigente para os restantes tipos de pretensões é
também a da sua dedução em sede de ação administrativa comum, em função do seu
carácter residual ( 37.º, 1 CPTA). Caso na sequência de uma sentença emitida em
processo de declaração, a administração não cumpra voluntariamente os deveres
que sobre ela impedem para restabelecer os direitos ou interesses violados, os
particulares podem utilizar o processo executivo previsto nos arts 162.º - 172º
CPTA.
O não restabelecimento
legítimo de posições jurídicas subjectivas violadas
Situações em que é legítimo o não restabelecimento de
posições jurídicas subjectivam violadas.
Até á decisão do processo jurisdicional pode sobrevir uma
circunstância que torne o restabelecimento material ou juridicamente inviável.
Nesse caso a administração pode legitimamente furtar-se à adopção de condutas
necessárias a tal restabelecimento. Em geral estas situações são duas: a
impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público.
A) Impossibilidade absoluta ( Art. 163º , 1 CPTA). O restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas
não pode ter lugar caso se tenha tornado impossível. Por exemplo, uma coisa
ilegitimamente apropriada pela administração e entretanto destruída não pode,
por absoluta impossibilidade física, ser devolvida ao seu proprietário.
B) Grave Prejuízo para o interesse público (
art.163.º, 1 CPTA). O restabelecimento da posição jurídica subjectiva violada
provoque um grave prejuízo para o interesse público. Assim, um terreno
ilegalmente ocupado pela administração e nele tenha sido construída uma
auto-estrada, o restabelecimento do direito de propriedade implicaria
necessariamente a destruição daquela e assim lesar o interesse público de forma
colossal. Apesar de a lei não o referir expressamente, trata-se de uma
aplicação do princípio da proporcionalidade, pelo que não se poderá deixar de
ponderar a razoabilidade do sacrifício do interesse no restabelecimento do
direito ou interesse violado em face da necessidade de garantir a
intangibilidade de um concreto interesse público.
José Carlos Alves nº21700
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