sábado, 18 de maio de 2013


As pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas no âmbito da responsabilidade civil administrativa.

Noção e aspectos gerais
Caso a administração viole uma posição jurídica subjectiva de um particular, a este não interessará apenas, e em regra nem sequer principalmente, a reparação dos danos eventualmente provocados pela conduta administrativa; a obter em sede de responsabilidade civil; com efeito o seu interesse principal será de obter o restabelecimento da posição jurídica violada. Este restabelecimento passará necessariamente pelo acatamento por parte da administração, dos deveres a que estava adstrita perante o particular e que antes não tinha observado; os deveres em causa podem ser deveres gerais de respeito ou deveres creditícios, consoante a posição jurídica violada seja absoluta ou relativa. A pretensão a este restabelecimento é também uma pretensão reintegratória que assiste aos particulares em face da administração.

Fundamento das pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.
As pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas encontram o seu fundamento subjectivo na vinculação da administração pública aos direitos fundamentais ( Art. º 1 CRP) e no principio do respeito pelas posições jurídicas subjectivas dos particulares (art. 266.º, 1 CRP) e fundamento objectivo no principio de legalidade. Da combinação de ambos decorre a proibição de violação de posições jurídicas subjectivas alheias e tendo ocorrido,  ao seu posterior restabelecimento.

Pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas e responsabilidade civil
A grande diferença entre estas pretensões reintegratórias dos particulares perante a administração está nas suas funções: enquanto que a primeira visa reintegrar as esferas jurídicas dos particulares pelos danos sofridos em virtude da atuação administrativa, operando por isso para o futuro, as segundas visam eliminar a ilegalidade cometida com a conduta administrativa, agindo por isso sobretudo sobre o passado. Daqui decorre que enquanto a responsabilidade civil é uma pretensão secundária, que visa a compensação de direitos que foram violados, as pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas são pretensões primárias, pois visam a realização daqueles direitos, possível por não se ter ainda consumado a sua inutilização prática. Assim o restabelecimento de direitos e interesses violados não consiste numa indemnização  ainda que natural ou especifica, que é sempre um sucedâneo do bem danificado, mas a restauração da própria posição jurídica subjectiva violada.
Por exemplo se a administração ocupar materialmente de forma ilegal um terreno de que é proprietário um particular, privando-o do rendimento que aquele terreno lhe propicia, o proprietário adquire por um lado, uma pretensão á restituição do imóvel (restabelecimento do direito de propriedade privado) e por outro lado, uma pretensão ao ressarcimento dos lucros cessantes, não auferidos em virtude da ilegítima privação do exercício do direito de propriedade (responsabilidade civil da administração).
Ambas são cumuláveis entre si, designadamente quando a tutela primária não apague todas as lesões decorrentes da conduta administrativa.

Tipos de Pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.

Pretensões possessórias: A posse está definida no artigo 1251.º CC. Quando haja justo receio de que ocorra uma perturbação da posse de um particular sobre uma coisa por parte da administração, quando essa perturbação ocorra efetivamente ou quando haja esbulho ( privação ilegítima da posse) por parte da administração os particulares adquirem uma pretensão reintegratória da posse violada.

Pretensões reivindicatórias: A reivindicação é precisamente, a pretensão que visa o reconhecimento judicial da propriedade ou de outro direito real sobre uma coisa e a restituição desta, por quem a detenha ou possua ilegitimamente, ao seu legítimo titular.

Pretensões inibitórias: As pretensões inibitórias visam impedir atividades da administração que, sem subtraírem a coisa a quem seja titular de um direito real sobre ela, todavia o ameaçam ou perturbam. Exemplo: equipamento administrativo emite ruido ou gases que se fazem sentir dentro de habitações.

Pretensões creditórias: Dos contratos administrativos e dos atos administrativos podem emergir para a administração deveres de efetuar prestações em beneficio dos particulares. Se a administração não cumprir os interessados dos direitos creditícios violados tem o direito de exigir o cumprimento dos contratos ou dos atos administrativos em causa.

Pretensões à reintegração de situações jurídicas lesadas por atos administrativos ou regulamentos imediatamente aplicáveis nulos ou inexistentes: A ocorrência de determinados atos ou omissões antes da certificação de nulidade ou inexistência de regulamentos e atos administrativos (Exemplo: quando o trabalhador for demitido ou despedido mediante um ato administrativo nulo deixando em consequência administração de cumprir o dever, que lhe assistia, de pagamento de vencimentos) investe aos particulares lesados numa pretensão ao restabelecimento fático da situação jurídica que existiria se o ato nulo não tivesse sido praticado.

Pressupostos das pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.
As pretensões em causa visam apenas reintegrar posições jurídicas subjectivas violadas, pelo que é irrelevante para a sua existência a ocorrência de qualquer dano ou a formulação de um juízo de censura quanto a quem as violou. Quem seja, por exemplo, ilegitimamente privado do exercício do seu direito de propriedade sobre uma coisa deve poder ser nele reintegrado independentemente de sofrer danos com a sua privação ou de quem o lesou o fazer culposamente. Assim, são apenas dois os pressupostos destas pretensões: a existência de uma situação de afetação de uma posição jurídica subjectiva de um particular pela administração e o carácter ilegítimo dessa afetação.

O conteúdo do restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.
O restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas pode implicar a prática de factos positivos ou negativos, materiais ou imateriais, a entrega de coisas, ou o pagamento de quantia. São precisamente estas as três finalidades dos processos de execução das sentenças dos tribunais administrativos (arts. 162.º - 169.º, 170.º - 172.º CPTA) nos quais desembocará em ultima análise a efetivação jurisdicional destas pretensões.

Modos de efetivação das pretensões ao restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas.        
Estas podem ser satisfeitas pela administração, espontaneamente ou a requerimento do interessado. Contudo, tipicamente, a sua efetivação faz-se perante os tribunais.
O art. 37.º,2,d) CPTA prevê que determinados processos sigam genericamente a forma de ação administrativa comum. As pretensões inibitórias e as pretensões ao cumprimento de contratos administrativos recaem ainda nas previsões do art.37.º, 2, c), 1º parte, e e), 2º parte , CPTA. As pretensões ao cumprimento de atos administrativos podem ser deduzidas em sede de processo executivo ( 157.º, 3 CPTA).
A regra vigente para os restantes tipos de pretensões é também a da sua dedução em sede de ação administrativa comum, em função do seu carácter residual ( 37.º, 1 CPTA). Caso na sequência de uma sentença emitida em processo de declaração, a administração não cumpra voluntariamente os deveres que sobre ela impedem para restabelecer os direitos ou interesses violados, os particulares podem utilizar o processo executivo previsto nos arts 162.º - 172º CPTA.

O não restabelecimento legítimo de posições jurídicas subjectivas violadas

Situações em que é legítimo o não restabelecimento de posições jurídicas subjectivam violadas.
Até á decisão do processo jurisdicional pode sobrevir uma circunstância que torne o restabelecimento material ou juridicamente inviável. Nesse caso a administração pode legitimamente furtar-se à adopção de condutas necessárias a tal restabelecimento. Em geral estas situações são duas: a impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público.
A)     Impossibilidade absoluta ( Art. 163º , 1 CPTA). O restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas não pode ter lugar caso se tenha tornado impossível. Por exemplo, uma coisa ilegitimamente apropriada pela administração e entretanto destruída não pode, por absoluta impossibilidade física, ser devolvida ao seu proprietário.

B)      Grave Prejuízo para o interesse público ( art.163.º, 1 CPTA). O restabelecimento da posição jurídica subjectiva violada provoque um grave prejuízo para o interesse público. Assim, um terreno ilegalmente ocupado pela administração e nele tenha sido construída uma auto-estrada, o restabelecimento do direito de propriedade implicaria necessariamente a destruição daquela e assim lesar o interesse público de forma colossal. Apesar de a lei não o referir expressamente, trata-se de uma aplicação do princípio da proporcionalidade, pelo que não se poderá deixar de ponderar a razoabilidade do sacrifício do interesse no restabelecimento do direito ou interesse violado em face da necessidade de garantir a intangibilidade de um concreto interesse público. 

José Carlos Alves nº21700  

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