O Poder Discricionário da Administração, enquadra-se na matéria dos Princípios constitucionais sobre o
poder administrativo, contidos no artigo 266º CRP, ao lado do princípio da
prossecução do interesse público, princípio da legalidade, princípio do
respeito dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares,
princípio da justiça (sentido amplo), princípio da igualdade, princípio da
proporcionalidade, princípio da boa fé, princípio da justiça (sentido restrito)
e princípio da imparcialidade.
A Administração está subordinada à lei nos termos do princípio da
legalidade. Mas esta última não regula da mesma forma os actos a praticar pela
administração pública: a lei pode concretizar tudo ao pormenor ou noutra
situação pode habilitar a administração a determinar ela mesma que escolhas
tomar. Deste modo, a regulamentação legal da actividade administrativa umas
vezes é precisa e outras vezes é imprecisa (quando não associa à situação jurídica
uma única consequência jurídica, mas habilita a Administração a determinar ela
própria essa mesma consequência).
Nesta matéria, o Professor Diogo Freitas do Amaral enuncia-nos dois
exemplos de situações extremas que podem acontecer relativamente ao acima
referido, sendo estes:
1. Actos tributários - nesta matéria de impostos, as leis definem tudo. Aqui
a Administração desempenha tarefas puramente mecânicas visando um resultado
único legalmente possível. Na matéria de impostos pode-se dizer que a lei
vincula totalmente a Administração, não tendo esta a possibilidade de fazer
outra escolha, sendo o acto administrativo um acto vinculado.
2. Nomeação de um
governador civil - segundo esta situação e a disposição legal DL nº252/92 artigo
3º, de 19 de Novembro, o Governo pode escolher qualquer cidadão português. A
nomeação traduz-se num acto discricionário em vários aspectos mas não em todos,
pois o governo nao pode nomear estrangeiros, por exemplo. Neste caso, a lei
praticamente nada diz, nada regula e atribui uma significativa margem de
autonomia à Administração pública. É esta que tem de decidir segundo os
critérios que em cada caso entender mais adequados à prossecução do interesse
público.
Em suma, estamos perante, por um lado, actos vinculados, pelo outro, actos
discricionários. Vinculação e Discricionariedade são, deste modo, as duas
formas típicas pelas quais a lei modela a actividade da Administração pública.
Para a definição dos conceitos mencionados, podem adoptar-se duas perspectivas
diferentes: a perspectiva dos poderes (teoria da organização) e perspectiva dos
actos (teoria da actividade).
O poder é vinculado quando a lei não remete para o critério do respectivo
titular, que pode e deve escolher o procedimento a adoptar em cada caso como
mais ajustado à realização do interesse público protegido pela norma que o
confere. Dizem-se actos vinculados quando praticados pela Administração, e
actos discricionários quando praticados no exercício de poderes
discricionários. Contudo, em regra, não existem actos totalmente
discricionários, nem actos totalmente vinculados. É por isso então que, em
relação a um poder, faz sentido perguntar se se trata de um poder vinculado ou
de um poder discricionário.
Mas, aqui, o que importa realmente questionar é em que medida é que são
vinculados e discricionários? No primeiro exemplo supra referido (do acto
tributário), a vinculação é quase total, mas msmo assim existe uma pequena zona
onde é demonstrada discricionariedade. No segundo exemplo, a autonomia
conferida ao Governo é bastante ampla, mas a lei estabelece diversas
condicionantes, por exemplo, diz que a competência para nomear Governadores
civis pertence ao Conselho de Ministros, por proposta do Ministro da
Administração Interna. A competência é sempre vinculada, mesmo nos actos
discricionários.
Quanto à sua natureza: coloca-se a
questão de saber se pode o órgão competente escolher livremente qualquer uma
das várias soluções conformes com o fim da lei? A resposta é negativa. O
processo de escolha a cargo do órgão administrativo não está somente
condicionado pelo fim legal, está também condicionado e orientado por ditames
que flúem dos princípios e regras gerais que vinculam a Administração Pública
(igualdade, proporcionalidade e imparcialidade) estando desta forma o órgão
administrativo obrigado a encontrar a melhor solução para o interesse público.
Entende-se que o poder discricionário não é um poder livre, dentro dos limites
da lei, mas sim um poder jurídico.
Qual o fundamento e o significado deste poder
discricionário?
A lei tem casos em que pode regular todos os aspectos e nesses mesmo casos a
actuação da Administração Pública, traduz-se numa mera aplicação da lei
abstracta ao caso concreto, por meio de operações lógicas. Para além das razões
práticas, existem também razões jurídicas. O poder discricionário visa, antes
de tudo, assegurar o tratamento equitativo dos casos individuais.
Juridicamente, este poder fundamenta-se, afinal, tanto no princípio da
separação dos poderes, tanto na própria concepção do Estado Social de Direito,
enquanto Estado prestador e constitutivo de deveres positivos para a
Administração.
O poder discricionário não é um poder
arbitrário, é sim um poder derivado da lei. Tal poder só pode ser exercido: por
aqueles a quem a lei o atribuir; para o fim com que a lei o confere; e deve ser
exercido de acordo com certos princípios jurídicos de actuação. O poder
discricionário não é uma excepção ao princípio da legalidade, mas sim uma das
formas possíveis de estabelecer a subordinação da Administração à lei.
Qual o seu âmbito? Em primeiro lugar, o momento
da prática do acto; depois, a decisão de praticar ou não um certo acto
administrativo; a determinação dos factos e interesses relevantes para a decisão;
o conteúdo concreto da decisão; a forma e as formalidades; a fundamentação ou
não da decisão; ou a faculdade de apor ou não no acto administrativo condições,
termos, modos ou outras cláusulas acessórias.
Por fim, quais os seus limites? Em primeiro,
surgem-nos os limites legais e constitucionais. Seguidamente, temos os limites
que decorram de auto – vinculação
Contudo, a possibilidade de auto – vinculação da
Administração não é ilimitada. A Administração não se pode auto-vincular com
desrespeito do artigo 112.º, n.º 5 da CRP. Podem, no entanto, haver casos em
que a lei queira que a Administração exerça efectivamente caso a caso o seu
poder de apreciação das circunstâncias concretas – aqui a auto-vinculação é
ilegal.
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