quinta-feira, 25 de abril de 2013

O perigo do silêncio da Administração


No leque dos princípios pelos quais se deve pautar a actividade administrativa, podemos encontrar o princípio da decisão, consagrado no art. 9º CPA, segundo o qual, “os órgãos administrativos têm (…) o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados pelos particulares”. Daqui se pode concluir que não devem, os órgãos da Administração Pública, manter-se pura e simplesmente silenciosos perante as questões que lhes sejam dirigidas pelos particulares. Pelo contrário, à Administração cabe o dever de decidir sobre quaisquer assuntos que lhe sejam apresentados. Este dever só deixa de existir no caso de a entidade competente já se tiver pronunciado há menos de dois anos sobre igual pedido, apresentado pelo mesmo particular.
Decorre do exposto que a forma típica de extinção do procedimento administrativo é a decisão final da Administração que, à luz do art. 107º CPA, tem de ser expressa e resolver todas as questões surgidas durante aquele processo. Ponto importante resulta do art. 124º CPA, nos termos do qual é exigível à Administração fundamentação das suas decisões, na grande maioria dos casos. Esta fundamentação deve apresentar-se de forma clara suficiente (para se perceberem as razões que basearam a decisão) e não contraditória. É com base nesta fundamentação que o particular poderá agir contenciosamente.
Resumido o processo típico, cabe agora salientar que nem sempre a Administração realiza os trâmites legais descritos, ou seja, em certos casos, assistimos a um silêncio da Administração que se traduz na ausência de decisão administrativa. Ora, se a Administração Pública se mantiver em silêncio ,sem decidir no termo do procedimento, isso pode, logicamente, comprometer e prejudicar os interesses dos particulares, na medida em que se deparam com falta de resposta aos seus pedidos. Prevendo estas hipóteses em que a Administração nada diz, o CPA atribui determinado significado a essa inércia administrativa. Fá-lo de duas formas: deferimento tácito e indeferimento tácito, arts. 108º e 109º, respectivamente, CPA.
Designando esta situação como acto tácito, este mais não é que uma não-decisão da Administração, em confronto com o preceituado no art. 9º CPA. Assim, o código prevê o sistema do (in)deferimento tácito. Ao estabelecer, expressamente, o princípio da decisão, abriu o caminho para a noção de omissão juridicamente relevante, geradora de efeitos jurídicos.
Para a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA: acórdão de 11.01.2005, processo nº 0560/04 e acórdão de 14.03.2006, processo nº 0762/05), o acto tácito, traduz-se em poder interpretar-se, para certos efeitos e em certas circunstâncias previstas na lei, a passividade ou o silêncio de um órgão administrativo como significando o deferimento ou indeferimento de uma pretensão formulada pelo interessado, quando a Administração tem a obrigação de se pronunciar, com vista a proteger o interessado contra uma tal passividade. Trata-se, portanto, de uma forma de proteger a Administração em face da inércia da Administração.
O acto tácito pode ser positivo ou negativo. A grande diferença reside no facto de, perante o deferimento tácito, a Administração nada fazer e, ainda assim, surgir algo de novo na Ordem Jurídica; ao passo que, face ao indeferimento tácito, a Administração nada faz e nada surge, será como um “duplo-nada”. Ora, se a Administração não age, mas tal também não tem efeitos jurídicos, não se levantam problemas de maior. A mesma afirmação não se pode fazer relativamente ao deferimento tácito, que cria problemas práticos. Poderá mesmo dizer que cria quantos mais problemas práticos, quanto mais actos foram exigidos para a actuação da Administração. Ressalve-se que há a produção de efeitos jurídicos, mesmo que a Administração se mantenha inerte. Como fica a segurança jurídica? Note-se que quanto mais complexo for um projecto, maior será a insegurança jurídica. No entanto, parece que o CPA, no seu art. 108º, se conformou com a insegurança jurídica do diferimento tácito.

Sendo preterido todo o procedimento administrativo, aquando da obtenção dos efeitos jurídicos do diferimento tácito, terá faltado toda a fundamentação exigida à Administração na sua tomada de decisões. Se o diferimento tácito consegue criar os mesmos efeitos jurídicos que criaria a decisão favorável da decisão, já não é capaz de suprir a ausência dos actos preparatórios do acto final. Perece, com isto, que o CPA admitiu a preterição de formalidades legalmente exigidas no decorrer da Administração Pública. Parece ser, portanto, uma preterição legal dos trâmites exigidos para o procedimento administrativo.
Esta inércia dos órgãos administrativos é susceptível de criar efeitos jurídicos na Ordem Jurídica, concedendo, desta forma, direitos a um particular. Mas, o que sucederá se esse direito assim concedido, for contrário ao interesse público? Entramos, neste contexto, na bivalência, na tensão dialéctica, entre o interesse privado e o interesse público?
Sendo o Direito a “Ciência” do bom senso, impera que se defenda a necessidade de um equilíbrio, de uma harmonização de interesses.

Ana Sofia Ribeiro n.º20766

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