No leque dos princípios pelos quais se deve pautar a
actividade administrativa, podemos encontrar o princípio da decisão, consagrado
no art. 9º CPA, segundo o qual, “os órgãos administrativos têm (…) o dever de
se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam
apresentados pelos particulares”. Daqui se pode concluir que não devem, os
órgãos da Administração Pública, manter-se pura e simplesmente silenciosos
perante as questões que lhes sejam dirigidas pelos particulares. Pelo
contrário, à Administração cabe o dever de decidir sobre quaisquer assuntos que
lhe sejam apresentados. Este dever só deixa de existir no caso de a entidade
competente já se tiver pronunciado há menos de dois anos sobre igual pedido,
apresentado pelo mesmo particular.
Decorre do exposto que a forma típica de extinção do
procedimento administrativo é a decisão final da Administração que, à luz do
art. 107º CPA, tem de ser expressa e resolver todas as questões surgidas
durante aquele processo. Ponto importante resulta do art. 124º CPA, nos termos
do qual é exigível à Administração fundamentação das suas decisões, na grande
maioria dos casos. Esta fundamentação deve apresentar-se de forma clara
suficiente (para se perceberem as razões que basearam a decisão) e não
contraditória. É com base nesta fundamentação que o particular poderá agir
contenciosamente.
Resumido o processo típico, cabe agora salientar que nem
sempre a Administração realiza os trâmites legais descritos, ou seja, em certos
casos, assistimos a um silêncio da Administração que se traduz na ausência de
decisão administrativa. Ora, se a Administração Pública se mantiver em silêncio
,sem decidir no termo do procedimento, isso pode, logicamente, comprometer e
prejudicar os interesses dos particulares, na medida em que se deparam com
falta de resposta aos seus pedidos. Prevendo estas hipóteses em que a
Administração nada diz, o CPA atribui determinado significado a essa inércia
administrativa. Fá-lo de duas formas: deferimento tácito e indeferimento
tácito, arts. 108º e 109º, respectivamente, CPA.
Designando esta situação como acto tácito, este mais não é
que uma não-decisão da Administração, em confronto com o preceituado no art. 9º
CPA. Assim, o código prevê o sistema do (in)deferimento tácito. Ao estabelecer,
expressamente, o princípio da decisão, abriu o caminho para a noção de omissão
juridicamente relevante, geradora de efeitos jurídicos.
Para a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo
(STA: acórdão de 11.01.2005, processo nº 0560/04 e acórdão de 14.03.2006,
processo nº 0762/05), o acto tácito, traduz-se em poder interpretar-se, para
certos efeitos e em certas circunstâncias previstas na lei, a passividade ou o
silêncio de um órgão administrativo como significando o deferimento ou
indeferimento de uma pretensão formulada pelo interessado, quando a
Administração tem a obrigação de se pronunciar, com vista a proteger o
interessado contra uma tal passividade. Trata-se, portanto, de uma forma de
proteger a Administração em face da inércia da Administração.
O acto tácito pode ser positivo ou negativo. A grande
diferença reside no facto de, perante o deferimento tácito, a Administração
nada fazer e, ainda assim, surgir algo de novo na Ordem Jurídica; ao passo que,
face ao indeferimento tácito, a Administração nada faz e nada surge, será como
um “duplo-nada”. Ora, se a Administração não age, mas tal também não tem
efeitos jurídicos, não se levantam problemas de maior. A mesma afirmação não se
pode fazer relativamente ao deferimento tácito, que cria problemas práticos.
Poderá mesmo dizer que cria quantos mais problemas práticos, quanto mais actos
foram exigidos para a actuação da Administração. Ressalve-se que há a produção
de efeitos jurídicos, mesmo que a Administração se mantenha inerte. Como fica a
segurança jurídica? Note-se que quanto mais complexo for um projecto, maior
será a insegurança jurídica. No entanto, parece que o CPA, no seu art. 108º, se
conformou com a insegurança jurídica do diferimento tácito.
Sendo preterido todo o procedimento administrativo, aquando
da obtenção dos efeitos jurídicos do diferimento tácito, terá faltado toda a
fundamentação exigida à Administração na sua tomada de decisões. Se o
diferimento tácito consegue criar os mesmos efeitos jurídicos que criaria a
decisão favorável da decisão, já não é capaz de suprir a ausência dos actos
preparatórios do acto final. Perece, com isto, que o CPA admitiu a preterição
de formalidades legalmente exigidas no decorrer da Administração Pública. Parece
ser, portanto, uma preterição legal dos trâmites exigidos para o procedimento
administrativo.
Esta inércia dos órgãos administrativos é susceptível de
criar efeitos jurídicos na Ordem Jurídica, concedendo, desta forma, direitos a
um particular. Mas, o que sucederá se esse direito assim concedido, for
contrário ao interesse público? Entramos, neste contexto, na bivalência, na
tensão dialéctica, entre o interesse privado e o interesse público?
Sendo o Direito a “Ciência” do bom senso, impera que se
defenda a necessidade de um equilíbrio, de uma harmonização de interesses.
Ana Sofia Ribeiro n.º20766
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