quarta-feira, 17 de abril de 2013

O acto (?) de indeferimento tácito


Um acto administrativo é uma decisão de um orgão da administração pública que, ao abrigo de normas de direito público, visa produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta, tal como disposto no artigo 120º do Código do Procedimento Administrativo. É um acto positivo. Não existem decisões por omissão. Uma omissão pode ser, quando muito, a tradução de uma precedente, e eventualmente não exteriorizada, decisão de não agir. As omissões não são actos administrativos, ainda que a lei lhes associe o regime do acto administrativo.
Os actos de indeferimento são actos administrativos. Estes procedem à definição da posição da administração perante a pretensão formulada pelo particular, podendo ser impugnados. 

Sempre que a actividade administrativa é suscitada pela iniciativa de particulares, a administração tem o dever de decidir, conforme os artigos 9º e o 54º do CPA. 
Quando se reúnem os pressupostos do dever de decisão, a administração está obrigada a pronunciar-se sobre a pretensão do particular.
No entanto, por vezes a Administração Pública não o faz. Quando tal acontece podem gerar-se as seguintes consequências:
a) Invalidade do acto administrativo que ponha termo ao processo sem se pronunciar sobre a pretensão do particular.
b) Deferimento tácito da pretensão do particular (108ºCPA)
c) No CPA, está consagrado no seu artigo 109º o instituto do indeferimento tácito. Este acontece quando a lei faça decorrer da omissão a negação da pretensão formulada. 
O CPA consagrou o indeferimento tácito como regime-regra das omissões de actos administrativos devidos. No entanto, em 2004, o Código do Procedimento dos Tribunais Administrativos passou a consagrar a possibilidade de condenação jurisdicional da administração à prática de actos devidos. 
Então, segundo o que afirmam o professor Marcelo Rebelo de Sousa e o professor Vasco Pereira da Silva, quando a Administração não se pronuncia, o que os particulares devem fazer é condenar o Estado a uma acção de condenação à prática de acto devido, tendo-se tornado esta uma regra supletiva. Este instituto encontra-se regulado no artigo 268°/4 da Constituição da República Portuguesa e nos artigos 66º - 71º do CPTA. Actualmente é esta a consequência geral da violação do dever de violação.

Temos assim uma revogação tácita do indeferimento tácito, da qual podemos tirar alguma ironia.
O indeferimento tácito deixou de ter aplicação no ordenamento português em 2004, mas mesmo quando se aplicava este não era, como alguma doutrina o denominava, um acto administrativo. Segundo alguma jurisprudência, "o indeferimento é uma mera ficção jurídica destinada a possibilitar aos interessados o acesso à via contenciosa em situações de omissão pela Administração do seu dever de se pronunciar sobre as pretensões que lhe apresentaram" (Acórdão STA  de 11-10-2006, 1ª Secção, decisão em Subsecção, Processo n.º 614/06-12).
O indeferimento tácito é sim um acto tácito, cuja caracterização tem motivado uma grande divergência doutrinária.
O professor Sérvulo Correia afirma que este é "um verdadeiro acto administrativo", o professor Gonçalves Pereira considera-o "um mero facto jurídico" e o professor Freitas do Amaral considera-o "uma ficção de acto administrativo em toda a sua plenitude". O professor Marcelo não concorda com nenhuma destas definições, descrevendo o acto tácito como uma omissão indevida de um acto administrativo cuja emissão foi solicitada. A expressão "acto tácito" parece inculcar que da omissão se pode retirar um acto jurídico positivo, mas tal não acontece. Esta figura não é um acto administrativo mas um silêncio com significado.
É com esta opinião que me identifico mais, pois penso que um acto tácito corresponde à violação do dever de decisão por parte da Administração Pública, não se tratando de um verdadeiro acto administrativo.

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