Nas
palavras do autor Niggro “o acto
administrativo já não é mais o centro da gravidade do direito administrativo”.
A
actuação administrativa de hoje em dia já não recorre somente a meios unilaterais
– se hoje admitirmos a existência de um conceito central temos de o entender de
uma forma mais ampla e abrangente, de modo a abarcar as novas situações com que
a Administração se depara.
As
primeiras concepções da figura central do direito administrativo centravam-se
única e exclusivamente no Acto Administrativo – à volta deste conceito era
desenhada toda a realidade jurídica.
Esta
concepção “actocêntrica” denotava a preocupação do positivismo: a criação de um
modelo totalmente perfeito e definido.
No
quadro da lógica clássica, o acto administrativo era o único protagonista e
definia-se como sendo um acto definitivo, executório e autoritário. Este acto
tinha como base uma Administração agressiva e, consequentemente um Acto
Polícia.
Continuar
a funcionar com um modelo que já não satisfaz as necessidades reais e actuais
já não é possível: o paradigma do acto polícia no acto administrativo apenas é
válido nos parâmetros do Estado Liberal.
O
surgimento de novas funções do Estado no princípio do séc. XX e a alteração da
lógica da Administração – de uma Administração Agressiva para uma Administração
Prestadora – fez com que no âmbito deste novo entendimento (do procedimento
enquanto figura chave), tal realidade já não fosse suficientemente adequada à dos
dias de hoje.
Assim,
com a mudança de modelo de Administração, o arquétipo utilizado por esta já não
se centra somente no acto – de uma “farda única” para um “pronto a vestir”;
surgem, deste modo, novas e múltiplas formas de actuação: regulamentos,
contractos, operações materiais, planos e os próprios actos alterados por uma
outra crise de natureza interna.
Com
tantas formas de actuação tornou-se necessário descobrir o que haveria de comum
entre todas elas. Surgiram, assim, duas correntes de pensamento. Por um lado,
no direito italiano entendia-se que era o procedimento a realidade anterior e posterior
a todas as formas de actuação. Por outro lado, no direito alemão a base
genética comum a todas as formas de actuação traduzia-se nas relações jurídicas
que se iniciavam com o procedimento e que culminavam em direitos/deveres
constituídos.
De
acordo com a perspectiva de que o procedimento é a nova figura central do
direito administrativo é-nos possível apresentar duas vantagens: a primeira
relaciona-se com o facto de a utilização conceptual do procedimento como
elemento basilar permite uniformizar toda a actuação administrativa, no sentido
em que estabelece um método que se traduz num factor de racionalidade da decisão;
a segunda vantagem tem que ver com a possibilidade do procedimento permitir a
compreensão da integralidade da actividade administrativa desde o seu início
até ao momento da sua conclusão.
“O
resultado desta perspectiva italiana é a «deslocação do centro de gravidade da
actividade administrativa: do acto administrativo – concebido classicamente
como o resultado conclusivo preciso da actividade de preparação e elaboração da
decisão» – para o próprio “iter” da decisão” (Niggro).[i]
Concluindo,
considero que o procedimento, enquanto figura “central” do direito
administrativo, deve ser compreendido de uma forma autónoma, por forma a
torná-lo num instrumento de democraticidade e de legitimidade da Administração,
no sentido em que quando esta actua não está apenas preocupada com o resultado
final, mas também o modo como actua é importante; ela actua em linha com as
regras procedimentais, demonstrando uma forma de legitimação processual
autónoma.
Olhar
para o procedimento implica entender a Administração como uma cadeia de
acontecimentos e implica valorizar todos os actos de exercício do poder;
significa, portanto, valorizar a integralidade de todo o exercício do poder.
Catarina Pires
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