quarta-feira, 17 de abril de 2013

O procedimento administrativo como alternativo ao Acto Administrativo



Nas palavras do autor Niggro “o acto administrativo já não é mais o centro da gravidade do direito administrativo”.
A actuação administrativa de hoje em dia já não recorre somente a meios unilaterais – se hoje admitirmos a existência de um conceito central temos de o entender de uma forma mais ampla e abrangente, de modo a abarcar as novas situações com que a Administração se depara.
As primeiras concepções da figura central do direito administrativo centravam-se única e exclusivamente no Acto Administrativo – à volta deste conceito era desenhada toda a realidade jurídica.
Esta concepção “actocêntrica” denotava a preocupação do positivismo: a criação de um modelo totalmente perfeito e definido.
No quadro da lógica clássica, o acto administrativo era o único protagonista e definia-se como sendo um acto definitivo, executório e autoritário. Este acto tinha como base uma Administração agressiva e, consequentemente um Acto Polícia.
Continuar a funcionar com um modelo que já não satisfaz as necessidades reais e actuais já não é possível: o paradigma do acto polícia no acto administrativo apenas é válido nos parâmetros do Estado Liberal.
O surgimento de novas funções do Estado no princípio do séc. XX e a alteração da lógica da Administração – de uma Administração Agressiva para uma Administração Prestadora – fez com que no âmbito deste novo entendimento (do procedimento enquanto figura chave), tal realidade já não fosse suficientemente adequada à dos dias de hoje.
Assim, com a mudança de modelo de Administração, o arquétipo utilizado por esta já não se centra somente no acto – de uma “farda única” para um “pronto a vestir”; surgem, deste modo, novas e múltiplas formas de actuação: regulamentos, contractos, operações materiais, planos e os próprios actos alterados por uma outra crise de natureza interna.
Com tantas formas de actuação tornou-se necessário descobrir o que haveria de comum entre todas elas. Surgiram, assim, duas correntes de pensamento. Por um lado, no direito italiano entendia-se que era o procedimento a realidade anterior e posterior a todas as formas de actuação. Por outro lado, no direito alemão a base genética comum a todas as formas de actuação traduzia-se nas relações jurídicas que se iniciavam com o procedimento e que culminavam em direitos/deveres constituídos.
De acordo com a perspectiva de que o procedimento é a nova figura central do direito administrativo é-nos possível apresentar duas vantagens: a primeira relaciona-se com o facto de a utilização conceptual do procedimento como elemento basilar permite uniformizar toda a actuação administrativa, no sentido em que estabelece um método que se traduz num factor de racionalidade da decisão; a segunda vantagem tem que ver com a possibilidade do procedimento permitir a compreensão da integralidade da actividade administrativa desde o seu início até ao momento da sua conclusão.
“O resultado desta perspectiva italiana é a «deslocação do centro de gravidade da actividade administrativa: do acto administrativo – concebido classicamente como o resultado conclusivo preciso da actividade de preparação e elaboração da decisão» – para o próprio “iter” da decisão” (Niggro).[i]
Concluindo, considero que o procedimento, enquanto figura “central” do direito administrativo, deve ser compreendido de uma forma autónoma, por forma a torná-lo num instrumento de democraticidade e de legitimidade da Administração, no sentido em que quando esta actua não está apenas preocupada com o resultado final, mas também o modo como actua é importante; ela actua em linha com as regras procedimentais, demonstrando uma forma de legitimação processual autónoma.
Olhar para o procedimento implica entender a Administração como uma cadeia de acontecimentos e implica valorizar todos os actos de exercício do poder; significa, portanto, valorizar a integralidade de todo o exercício do poder.

Catarina Pires 
20591


[i] Cf. “Em Busca do Acto Administrativo Perdido”, Vasco Pereira da Silva pp 306/307, Almedina

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