segunda-feira, 25 de março de 2013

DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA e figuras afins


A discricionariedade administrativa é, por vezes, aproximada de outras realidades jurídicas, tais como: os conceitos indeterminados, e a aplicação de regras de Direito que remetem para regras extrajurídicas (como regras técnicas e específicas).
Pergunta-se:
 Estas realidades jurídicas acima enunciadas são figuras afins ou discricionariedade imprópria?
    - as figuras afins são aquelas que não são discricionariedade, ou seja, são uma realidade conceitualmente diferente, e consequentemente, não estão submetidas ao respectivo regime da discricionariedade. Pelo contrário, as situações de discricionariedade imprópria, apesar de, não serem verdadeira discricionariedade, encontram-se submetidas ao respectivo regime.

Destrinçados os conceitos, é tempo de dar resposta à pergunta de partida.

Inicialmente, para o Professor Diogo Freitas do Amaral, as duas realidades constituíam exemplos de figuras afins da discricionariedade, no entanto, no que respeita aos conceitos indeterminados, o Professor reviu a sua posição, vindo a admitir casos em que “ressalvam-se (…) os casos excepcionais em que a lei tenha expressamente pretendido conferir à Administração, através de um conceito vago e indeterminado, um poder discricionário ou uma margem de liberdade probatória”. O Professor Freitas do Amaral admite estas situações, com fundamento, na grande heterogeneidade dos conceitos indeterminados, sendo que, nem todos têm o mesmo sentido, e que alguns são utilizados pela lei, como um instrumento, para atribuir discricionariedade à Administração. Nesta medida, importa fazer distinções, entre aqueles conceitos que, Rogério Soares designa como conceitos-classificatórios, que são aqueles conceitos indeterminados em que a respectiva concretização envolve apenas a interpretação da lei e a subsunção, ou seja, a lei quando os prevê não atribuí qualquer discricionariedade ao órgão decisor (leia-se, à Administração), daqueles conceitos que o mesmo autor, classifica de conceitos-tipo cuja interpretação implica uma valoração por parte do órgão administrativo, traduzindo o exercício de um poder discricionário, e como tal, alheio a qualquer controlo por parte do tribunal.   
É relativamente a estes últimos que, o Professor Freitas do Amaral considera existir discricionariedade, modificando a sua posição inicial. Mas, ressalva que, só em concreto, por interpretação da lei, é possível determinar a que tipo se reconduz certo conceito indeterminado.
Já no que respeita, à aplicação de regras de Direito que remetem para regras extrajurídicas, o Professor mantém a sua posição, ou seja, considera que se tratam de figuras afins da discricionariedade. Na medida em que, quando a lei remete para regras extrajurídicas, torna-as juridicamente obrigatórias, incorporando-as na ordem jurídica, e por isso, obrigatórias para a Administração, sob pena de sofrer uma sanção em caso de não as respeitar, assim sendo, não se está no domínio da discricionariedade, mas sim, no da vinculação. Uma vinculação que só indirectamente é jurídica, por meio da remissão da lei, mas que não deixa de o ser, e por isso, não é discricionariedade, nem está sujeita ao respectivo regime.
Para o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, nenhuma das realidades referidas constituí discricionariedade, justificando que nelas não existe qualquer tipo de liberdade de escolha. Relativamente aos conceitos indeterminados, o Professor considera que, apresentam uma compreensão muito ampla, cabendo ao intérprete e aplicador interpretar e concretizar o seu sentido face ao caso concreto. No entanto, a sua interpretação e concretização não fornece um espaço de liberdade, pois, o intérprete tem de seguir determinadas pistas interpretativas, existindo sempre, uma vinculação legal e controlo judicial, não sendo por isso, discricionariedade.
Apresentadas as duas posições dos referidos Professores, denota-se neste ponto, uma divergência doutrinária, visto que, em certos casos, o Professor Diogo Freitas do Amaral admite existir discricionariedade em cede de interpretação de conceitos indeterminados, pelo contrário, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, considera nunca existir discricionariedade, constituindo uma verdadeira figura afim da discricionariedade.
No que se refere aos casos em que a lei remete para regras extrajurídicas, entende o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, em conformidade, com o Professor Freitas do Amaral, que lei ao fazer a remissão para essas regras, está a integrá-las na ordem jurídica, tornando-se obrigatórias e vinculando a Administração, portanto, não há discricionariedade, há sim, controlo jurisdicional da sua interpretação e aplicação.  
Depois de tudo o que referi, é possível dar uma resposta à pergunta inicial e concluir que, tanto os conceitos indeterminados como a remissão para regras extrajurídicas são exemplos de figuras afins da discricionariedade, ou seja, realidades distintas e consequentemente com regimes jurídicos também distintos. Porém, com a ressalva de que para o Professor Freitas do Amaral, nos casos dos chamados conceitos-tipo (designação de Rogério Soares) há discricionariedade. Para finalizar, no entendimento do Professor Freitas do Amaral, um exemplo de discricionariedade imprópria é a liberdade probatória, isto é a liberdade de avaliação ou de prova atribuída por lei à Administração, nomeadamente nos procedimentos fiscais. Contrariamente, Marcelo Rebelo de Sousa, considera que também é um exemplo de figuras afins, porque, entende, que a liberdade probatória está subordinada a todos os princípios legais e constitucionais da actividade administrativa, princípios que, de certa forma, confirmam o poder de controlo por parte dos tribunais, justificação que na óptica do Professor torna questionável qualificar a figura da liberdade probatória como discricionariedade imprópria.


Telma Gonçalves, sub 3. 
21020 

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