quinta-feira, 25 de abril de 2013

A revogação e os princípios constitucionais: a colisão de princípios

 A actividade administrativa é, como sabemos, estruturada e condicionada por princípios constitucionais, presentes ao longo de todo o texto constitucional, concretamente no artigo 266º da Constituição da República Portuguesa. Analisando o referido artigo concluímos que são vários os princípios que limitam toda a actividade administrativa, nomeadamente, o princípio da prossecução do interesse público, da legalidade, do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé. Porém, face ao tema em análise, apenas serão aprofundados e destacados alguns dos princípios acima referidos. Assim sendo, começo por analisar o primeiro princípio presente no artigo 266º/1 da Constituição, o princípio da prossecução do interesse público, o princípio chave da Administração pública, isto porque, "a Administração existe, actua e funciona para prosseguir o interesse público, este é o seu fim". A este propósito, é importante ter presente uma ideia de interesse público como um interesse colectivo, ou seja,  um interesse geral de uma determinada comunidade, pretendendo satisfazer as suas necessidades e atingir o bem comum, sempre com a observância do dever de boa administração. No entanto, é por existirem outros princípios, como por exemplo, o princípio da legalidade e o do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, que a Administração tem de prosseguir o interesse público dentro de certos limites e com respeito a determinados valores, isto é, tem de obedecer à lei, e não pode pôr em causa ou violar as situações juridicamente protegidas dos particulares. Em termos gerais, os princípios e os valores, são uma espécie de molde através do qual a actividade administrativa determina a sua conduta, porém, e como é sabido, em termos práticos, nem sempre é linear e acabam por surgir conflitos de várias ordens, como exemplo, colisão entre estes princípios.
 Esta questão da colisão entre princípios é equacionável no que respeita à revogação que “é acto administrativo que se destina a extinguir, no todo ou em parte, os efeitos de um acto administrativo anterior”. Tal como refere o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, os já mencionados princípios da legalidade e da prossecução do interesse público são os principias fundamentos do instituto da revogação dos actos administrativos, embora não sejam os únicos. E se estes princípios são os que favorecem a revogação de actos ilegais ou inconvenientes, quid juris quanto aos princípios do respeito pelos interesses legalmente protegidos dos particulares, e da tutela da confiança, ou segurança jurídica? Como referi, os primeiros sustentam a revogação de um acto em prol da prossecução do interesse público, do bem comum e da legalidade, por outra lado, os segundos (ou seja, o respeito pela protecção dos interesses legalmente protegidos, e a tutela da confiança) podem, contrariamente, sustentar a manutenção do acto que se pretende revogar, surgindo uma colisão de princípios, que deve, a meu a ver, ser resolvida atendendo em primeiro lugar, ao caso concreto, ideia que decorre do próprio dever de boa administração, o qual impõe que Administração na sua obrigação de seguir o interesse público adopte, em relação a cada caso, a melhor solução possível. Em segundo lugar, deve atender-se a todos os princípios constitucionais que influenciam a actividade administrativa, sempre numa tentativa de harmonização entre os princípios/interesses em conflito, com o fim último de nunca sacrificar a legalidade, aqui entenda-se também a protecção dos interesses dos particulares, aliás, foi assim que nasceu o princípio da legalidade como limite à actuação da Administração pública visando proteger os direitos e interesses dos particulares, pretendo atingir um ponto de equilíbrio. É este estado de equilíbrio "entre a necessidade de reintegração da legalidade e da boa administração e as exigências de estabilidade, segurança e previsibilidade de actuação administrativa", que o Código do Procedimento Administrativo pretende atingir ao prever limitações aos poderes revogatórios da Administração, em determinadas situações, veja-se o artigo 140º/1 alíneas a, b, c. O referido preceito em algumas situações, nomeadamente, quando resulta de vinculação legal; quando forem actos constitutivos de direitos e interesses legalmente protegidos; e ainda quando resulte para a Administração obrigações legais ou direitos irrenunciáveis limita a livre revogação dos actos administrativos válidos, afim de assegurar o tal ponto de equilíbrio.

Em conclusão, a Administração encontra-se subordinada a determinados princípios constitucionais, constantes do já assinalado artigo 266º da Constituição, os quais acabam por colidir no desenvolver da actividade administrativa, temos como exemplo o já acima desenvolvido, acto de revogação. Nestas situações torna-se imperativo harmonizar os diversos princípios em causa, e seguindo aquilo que o Professor Freitas do Amaral diz "os princípios coexistem”, portanto é numa perspectiva de coexistência e também de complementaridade, sempre com base no caso concreto que se conseguirá atingir o equilíbrio e assim salvaguardar a legalidade, a boa administração, os interesses legalmente protegidos dos particulares, e enfim prosseguir a melhor solução para a colectividade. 


Telma Gonçalves, sub 3.

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